Institui a "licitação sustentável", para aquisição de madeira, seus subprodutos, ou mobiliário proveniente de produção sustentável.
Autor: Deputado AUGUSTO CARVALHO - PPS (DF)
O CÂMARA DOS DEPUTADOS decreta:
Art. 1º Fica instituído o Programa Nacional de Qualidade Ambiental – PNQA.
Parágrafo único. São diretrizes do PNQA:
I - incentivar a constante melhoria da qualidade do serviço prestado pelos
diversos órgãos e entidades do Poder Executivo Federal;
II - promover mudanças nos padrões de consumo e estimular a inovação
tecnológica e ecologicamente eficiente, usando o poder de compra da administração
pública Federal para fins da política ambiental;
III - adotar critérios ambientais nas especificações de produtos e serviços a
serem adquiridos pelo Poder Executivo Federal, respeitada, no que couber, a legislação
de licitações e contratos;
IV - estimular a adoção de medidas de prevenção e redução do impacto
ambiental causado por produtos e serviços potencialmente danosos ao meio ambiente;
V - fomentar o reconhecimento e a promoção de práticas sócio-ambientalmente
adequadas pelo poder público e pela iniciativa privada;
VI - difundir na sociedade a cultura do consumo sustentável.
Art. 2º Para desenvolver o PNQA, caberá ao Poder Executivo Federal as
seguintes ações:
I - dar publicidade à importância do consumo de produtos ou do uso de serviços
de estabelecimentos que obtenham selos ambientais, divulgando o conceito de
certificação ambiental;
II - valorizar e prestigiar o uso de sistemas de gestão, de produtos e de serviços
adequados sob o ponto de vista social e ambiental pela administração pública;
III - definir os procedimentos e critérios para o reconhecimento da qualidade
ambiental de produtos, serviços ou sistemas de gestão a serem observados na
contratação pelo poder público, aceitando processos de certificação realizados por
entidades privadas devidamente creditadas, nacional ou internacionalmente, respeitada
a legislação de licitações e contratos;
IV - adequar a execução direta ou indireta das obras públicas para que o
consumo de bens ambientais seja o estritamente necessário;
V - desenvolver, progressivamente, instrumentos para dar suporte técnico à
especificação de bens e serviços a serem adquiridos ou contratados pela administração
pública, observada a legislação de licitações e contratos;
VI - estabelecer as parcerias necessárias à efetivação do PNQA.
§ 1º Para a aquisição, descrição, padronização e recebimento dos bens e serviços
com características técnicas complexas, conteúdos subjetivos ou em situações
especiais, poderão ser solicitados serviços de peritos como suporte para a tomada de
decisões.
§ 2º Em casos onde a contratação tenha aspectos ambientais relevantes, o
Ministério do Meio Ambiente e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, deverão participar da elaboração do processo
de contratação.
§ 3º As Comissões de Licitação poderão, em face da complexidade ou das
especificidades do objeto da licitação, solicitar a constituição de Comissão Especial ou
a inclusão de membros com conhecimentos apropriados para proceder ao exame e ao
julgamento das propostas.
§ 4º A quantidade de bens a serem adquiridos ou utilizados em obras e serviços
contratados pelo Poder Público deve ser estimada em conformidade com a demanda, de
modo a evitar o desperdício.
§ 5º O Poder Executivo exigirá, na fase de habilitação licitatória ou em qualquer
contratação direta, a documentação que comprove a legalidade do funcionamento da
contratada para fins ambientais, conforme a legislação aplicável sobre a atividade.
Art. 3° As licitações visando compras de madeira, seus subprodutos, ou
imobiliário, ou ainda a execução de obras ou serviços, direta ou indiretamente
contratados, que de alguma forma utilizem madeira ou seus sub-produtos, observarão
os preceitos desta Lei, da Lei de Licitações, e da legislação ambiental em vigor, em
particular os instrumentos legais relacionados ao manejo, licenciamento, transporte e
comercialização de produtos florestais.
Art. 4° Fica proibida a compra de mogno (Swietenia macrophylla king) pela
administração pública, em função das restrições legais impostas para sua proteção por
configurar espécie ameaçada de extinção, exceção feita aos produtos de mogno
certificados pelo Conselho de Manejo Florestal (FSC).
Art. 5° O Poder Executivo deverá exigir que as empresas que participarem de
processos de licitação apresentem provas da legalidade da cadeia de custódia dos
produtos madeireiros, informando a origem dos mesmos e garantindo que seus
fornecedores estão de acordo com as legislações ambiental e trabalhista vigentes no
Brasil.
Art. 6° As empreiteiras encarregadas de obras públicas deverão substituir o uso
de fôrmas e andaimes e outros utensílio descartáveis feitos de madeira proveniente da
Amazônia, salvo quando forem certificadas pelo FSC, por alternativas reutilizáveis e
ambientalmente sustentáveis disponíveis no mercado.
Art. 7° Em igualdade de condições, como critério de desempate, será assegurada
preferência aos bens proveniente de manejo florestal sustentável, através de mecanismo
de pontuação, privilegiando-se o fornecedor que já esteja certificado pelo FSC.
Art. 8° O Poder Público adquirirá, direta ou indiretamente, apenas madeira
proveniente de Plano de Manejo Florestal autorizado pelo Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA.
§ 1° Será exigida a apresentação de documentação que comprove a legalidade
dos produtos florestais, incluindo a Autorização de Transporte de Produtos Florestais
(ATPF) do IBAMA com a informação da origem e numero do Plano de Manejo, e uma
cópia da Declaração de Acompanhamento e Avaliação de Plano de Manejo Florestal –
DAAPMF, protocolada pelo IBAMA.
§ 2° Os números da Autorização de Transporte de Produtos Florestais (ATPF)
deverão ser publicados no Diário Oficial da União toda vez que o poder público
divulgar o resultado da licitação da compra dos produtos florestais.
§ 3° Visando a redução do desperdício de madeira, as licitações devem
especificar produtos de madeira com as menores dimensões possíveis, compatíveis com
os requisitos determinados pelo projeto onde o material será empregado.
Art. 9° Para fins de verificação do cumprimento da lei, os documentos que
comprovem a legalidade e sustentabilidade das compras públicas de madeira e outros
produtos florestais não madeireiros devem ser tornados públicos e de fácil acesso e
entendimento para a população.
Art. 10. Esta Lei será regulamentada no prazo de 180 (cento e oitenta) dias
contados da sua publicação.
Art. 11. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 12. Revogam-se as disposições em contrário.
JUSTIFICAÇÃO
A justificativa a seguir faz parte do Programa Cidade Amiga da Amazônia,
patrocinada pela organização ambientalista Greenpeace.
A proposta de uma lei para regulamentar a licitação para aquisição de madeira,
seus subprodutos, ou mobiliário proveniente de produção sustentável, entendida como
aquela gerada com base em manejo florestal sustentável, na qual se verifica adequação
legal de toda a cadeia de custódia do produto final, baseia-se nos seguintes preceitos e
princípios legais:
- A "Agenda 21", advinda da Resolução nº 44/228, de 22.12.89, da Assembléia
Geral da Organização das Nações Unidas, cujos princípios foram abraçados pelos
países membros por ocasião do "Encontro da Terra - Rio 92", propugna em seu
capítulo 4 que os países devem estabelecer programas voltados ao exame dos padrões
insustentáveis de produção e consumo e o desenvolvimento de políticas e estratégias
nacionais de estímulo a mudanças nos padrões insustentáveis de consumo;
- A “Declaração do Rio”, adotada no “Encontro da Terra”, ou “Rio 92”, prevê
em seu PRINCÍPIO 8 que "para atingir o desenvolvimento sustentável e a mais alta
qualidade de vida para todos, os Estados devem reduzir e eliminar padrões
insustentáveis de produção e consumo e promover políticas demográficas adequadas";
- A adoção de normas, em diversos países, como Japão, Canadá , Países Baixos,
Noruega, África do Sul, e em particular nos Estados Unidos, citando-se como exemplo
o regulamento baixado durante o governo Clinton (Executive Order Number 12.873),
que estabeleceu sistema de compras pelo Estado por meio de licitações baseadas em
regras de respeito ao meio ambiente e à cidadania, prevendo, dentre outras, a
obrigatoriedade da aquisição de materiais reciclados, como o papel, óleos lubrificantes
re-refinados, pneus reaproveitados, etc.;
- O direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, e a obrigação
do Poder Público em defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações em
explicitado no artigo 225, caput, da Constituição Brasileira;
- A previsão de que o Poder Executivo deve incentivar as atividades voltadas ao
meio ambiente, visando ao desenvolvimento, no País, de pesquisas e processos
tecnológicos destinados a reduzir a degradação da qualidade ambiental; à fabricação de
equipamentos antipoluidores; e outras iniciativas que propiciem a racionalização do
uso de recursos ambientais, segundo consta do artigo 13, da Lei de Política Nacional do
Meio Ambiente (Lei No. 6.938/81);
- A previsão de crimes contra a flora, previstos na Lei de Crimes Ambientais
(Lei 9.605/98), destacados nos artigos 38 a 53, e , em particular, aqueles descritos nos
artigo 45 e 46, que proíbem o corte ou transformação em carvão madeira de lei, assim
classificada por ato do Poder Público, para fins industriais, energéticos ou para
qualquer outra exploração, econômica ou não, em desacordo com as determinações
legais e o recebimento e aquisição para fins comerciais ou industriais, de madeira,
lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal, sem exigir a exibição de licença do
vendedor, outorgada pela autoridade competente, e sem munir-se da via que deverá
acompanhar o produto até final beneficiamento;
- A previsão na Lei de Crimes Ambientais dentre as sanções restritivas de
direitos para participação em processos licitatórios dos infratores da norma (art. 72 Par.
8º. - proibição de contratar com a Administração Pública, pelo período de até 3 (três)
anos);
- A obrigatoriedade de elaboração de Estudo de Impacto Ambiental no caso de
Projetos Agropecuários que contemplem áreas acima de 1.000 ha. ou menores, neste
caso, quando se tratar de áreas significativas em termos percentuais ou de importância
do ponto de vista ambiental, inclusive nas áreas de proteção ambiental, segundo
estabelecem as Resoluções CONAMA Nº. 01/86 e Nº. 11/86;
- As limitações impostas pela legislação à exploração da espécie Swietenia
macrophylla King (mogno) em florestas nativas, primitivas ou regeneradas, permitida
somente sob a forma de manejo florestal sustentável, nos prazos e condições definidos
nas normas pertinentes;
- A previsão em Portaria do IBAMA, de 2002, da obrigatoriedade de
procedimentos relativos às atividades de Manejo Florestal Sustentável de Uso Múltiplo
na Amazônia Legal;
- A definição em Instrução Normativa do Ministério do Meio Ambiente (IN Nº.
3 / 2002) dos procedimentos de conversão de uso do solo através de autorização de
desmatamento nos imóveis e propriedades rurais na Amazônia Legal.
Segundo especialistas reunidos sob os auspícios da ONU para estudar a
problemática em questão, o "consumo sustentável" significa o atendimento das
necessidades das gerações presentes e futuras por bens e serviços de uma forma
sustentável econômica, social e ambientalmente. Visto que o consumo sustentável
depende da disponibilidade de bens e serviços ambientalmente sustentáveis, esse
consumo está integralmente associado à produção sustentável.
A promoção do consumo sustentável implica necessariamente a redução do
volume de bens consumidos e a alteração dos hábitos de consumo de forma a promover
a melhoria da qualidade de vida e a proteção do meio ambiente. Para se alcançar essa
finalidade, é preciso que se procure adquirir apenas o necessário para uma vida digna,
minimizar o desperdício e a geração de rejeitos (resíduos), bem como promover o
consumo de bens e serviços gerados e produzidos de forma a respeitar o meio
ambiente.
O governo federal estima que 80% da atividade madeireira na Amazônia ocorra
de forma ilegal, ou seja, a madeira é extraída de áreas não autorizadas, como terras
públicas, reservas nacionais ou territórios indígenas e o desmatamento irregular avança
sobre áreas intactas de floresta. No aspecto social, explorar madeira de origem ilegal
significa promover a evasão fiscal, o uso de tecnologias obsoletas e a geração de
empregos irregulares de baixa qualidade, além de envolver casos de trabalho escravo e
de violência contra trabalhadores rurais.
Existem duas formas de se extrair madeira na Amazônia de forma legalizada:
através de autorizações de desmatamento e através de Planos de Manejo Florestal
(PMFs). Apesar de descritas no Código Florestal, ambas têm sido utilizadas de maneira
irregular acarretando elevados índices de destruição florestal.
As autorizações de desmatamento são concedidas a proprietários privados que
têm o direito de desmatar até 20% de suas terras. Geralmente, antes de fazer o corte
raso para fins agrícolas ou de criação de gado, os fazendeiros vendem as espécies de
valor comercial aos madeireiros e utilizam o capital desta venda para preparar o solo.
Cumpre salientar que esse mecanismo é bastante predatório, e que poucas são as
práticas legais de exploração de madeira.
O estado do Pará é um bom exemplo de como esse mecanismo tem sido
perverso para o bioma da Amazônia. O Pará responde por 40% da atividade madeireira
da Amazônia Legal, e representa 1/3 do total desmatado na região. Ao se avaliar
conjuntamente os dados das autorizações de desmate concedidas pelas autoridades no
estado com as imagens de satélite ilustrando o real desmatamento, pode-se concluir que
apenas 1% do desmatamento tinha amparo legal. Em 2001, por exemplo, o IBAMA
concedeu autorizações de desmate para 5.342 hectares, mas o total desmatado possível
de ser identificado a partir de imagens as dos satélites disponibilizadas pelo INPE –
Instituto Nacional de Pesquisa Espacial – é de 523.700 hectares. Os números dos anos
anteriores são similares.
A outra forma de extrair madeira da Amazônia de forma legal é através do
manejo florestal. Os Planos de Manejo Florestal (PMFs) foram criados para permitir a
exploração da madeira sem destruição dos ecossistemas. Infelizmente, na prática, não é
o que acontece. Hoje vivemos uma grande farsa na implementação do instrumento
"manejo florestal" na Amazônia. Desde 1995, milhares de planos foram aprovados
pelo IBAMA , mas as madeireiras usando os planos de manejo florestal para legalizar
a extração ilegal de madeira.
Um relatório do IBAMA, de 1998, mostra que apenas 31% (866) de um total de
2806 planos aprovados foram considerados regulares pelo próprio IBAMA. Um novo
relatório do IBAMA, de 2000, mostra que a irregularidade continuou. Somente 405 ou
49% dos 822 planos restantes foram considerados regulares ou em manutenção. Em
suma, somente 14% dos planos existentes em 1998 foram aprovados em avaliação do
próprio IBAMA. O cancelamento e suspensão dos planos tiveram causas diversas.
Muitos madeireiros contratavam engenheiros florestais apenas para conseguir a
aprovação dos planos no IBAMA e depois os dispensavam. Outros deixavam de
executar o plano sem avisar o IBAMA. Por outro lado, engenheiros florestais
produziam “planos de manejo em série" que não eram cumpridos na prática.
Para cada PMF aprovado são concedidos anualmente documentos de transporte
de madeira correspondentes, referentes ao volume previsto no plano. Outro problema
freqüente de irregularidade é o uso desses documentos de transporte para legalizar
madeira extraída de forma ilegal em áreas públicas ou griladas, parques nacionais,
reservas biológicas e áreas indígenas. Assim, hoje em dia, é difícil garantir a origem
legal do produto madeireiro.
Um bom exemplo é o mercado de mogno - a mais valiosa madeira da Floresta
Amazônica - que foi paralisado em dezembro de 2001, quando o IBAMA proibiu a
exploração, transporte e comércio da espécie após comprovar as irregularidades
freqüentes características desse setor. Ações de fiscalização realizadas nas áreas de
extração e nas empresas exportadoras constataram a exploração ilegal em terras
indígenas e áreas públicas, fraude e desrespeito à legislação florestal. No dia 05 de
julho de 2003, foi aprovada nova legislação para a exploração mogno, estabelecendo
rígidas regras para garantir o manejo sustentável da espécie. O mogno, espécie
ameaçada de extinção, foi listado no Anexo II da CITES, uma convenção internacional,
aprovada sob os auspícios da ONU, que regulamenta o comércio de espécies de fauna e
flora ameaçadas de extinção. Reconhecendo a fragilidade dessa espécie de madeira,
urge reconhecer que o mogno deve receber tratamento especial e ser considerado em
seu status atual na paisagem, como espécie de baixa densidade, com altíssimo valor
econômico e correndo o risco de extinção comercial.
O manejo florestal sustentável deve ser praticado em áreas em que a situação
fundiária esteja regularizada e onde não haja disputas de terras. Nas áreas manejadas
não ocorre extração ilegal ou outras atividades não -autorizadas. Note-se que ao se
promover o manejo florestal, não se pode ameaçar ou diminuir os recursos , nem
prejudicar os direitos dos povos indígenas e tradicionais, devendo-se manter ou
ampliar, em longo prazo, o bem-estar econômico e social dos trabalhadores e das
comunidades locais. Para assegurar a viabilidade econômica e benefícios sociais e
ambientais, o manejo deve incentivar o uso eficiente dos múltiplos recursos florestais,
conservando a diversidade ecológica e mantendo a integridade da floresta.
A fim de se promover o consumo sustentável de madeira é recomendável a
aquisição de produção certificada pelo FSC (Forest Stewardship Council). Atualmente,
são reconhecidos como os melhores padrões e critérios de manejo florestal aqueles
estabelecidos pelo FSC (Forest Stewardship Council, ou Conselho de Manejo
Florestal). O FSC é o único sistema de certificação independente que adota padrões
ambientais internacionalmente aceitos, incorpora de maneira equilibrada os interesses
de grupos sociais, ambientais e econômicos e tem um selo reconhecido no mundo
todo. O sistema de controle do FSC assegura a integridade da cadeia de custódia da
madeira desde o corte da árvore até a destinação final dos produtos, ao serem
adquiridos pelos consumidores. O FSC oferece a melhor garantia disponível de que a
atividade madeireira ocorre de maneira legal e não acarreta a destruição das florestas
primárias como as da Amazônia. Neste anteprojeto de lei recomenda-se priorizar a
aquisição de madeira certificada pelo FSC, sempre que possível.
A questão da licitação sustentável vem sendo discutida no âmbito das Nações
Unidas, através de seu Programa para o Meio Ambiente (PNUMA), que promove uma
série de eventos e tem gerado literatura a respeito. O PNUMA definiu como licitação
sustentável o processo pelo qual as organizações adquirem suprimentos ou contratam
serviços levando em consideração os seguintes aspectos:
• O melhor valor para considerações monetárias que incluam a análise de preço,
qualidade, disponibilidade, funcionalidade, dentre outras;
• Aspectos ambientais ("licitação verde"), que constituem os efeitos sobre o meio
ambiente que o produto e/ou serviço tem em todo o seu ciclo de vida, ou seja, do berço
ao túmulo;
• O ciclo de vida integral dos produtos;
• Aspectos sociais: efeitos sobre questões sociais tais como a erradicação da
pobreza, equidade internacional na distribuição de recursos, direitos trabalhistas,
direitos humanos.
A inclusão de princípios de desenvolvimento sustentável nas práticas licitatórias
já é uma realidade em vários países como o Canadá, Japão, Áustria, Itália, Países
Baixos, Noruega, Estados Unidos e África do Sul. As experiências nesses países
indicam que a inclusão de considerações sobre consumo e produção sustentável nas
opções de compra pelo poder público não só é viável, mas tem o importante papel de
incentivar um mercado sustentável.
No Brasil essa questão começa a ser discutida e implementada na prática. No
ano 2000, o Ministério do Meio Ambiente, através de uma iniciativa do Consórcio
Parceria 21, apresentou um documento de subsídios à Elaboração da Agenda 21
Brasileira, que abordou o tema do consumo e produção sustentáveis, no qual se
formulou como premissa para a implementação de políticas públicas na área, o preceito
de que o setor público deve usar o poder de compra do Estado para induzir o mercado
de bens e serviços a adotar padrões de qualidade ambiental.
A Associação Greenpeace identificou a "licitação sustentável" como uma das
formas de se promover a produção e o consumo sustentáveis, e vem desenvolvendo
campanha no Brasil em parceria com prefeituras visando a adoção de políticas de
consumo sustentável, o que inclui o incentivo à aquisição de madeira proveniente de
manejo sustentável. Nessa campanha o Greenpeace tem estimulado prefeituras a
adotarem critérios para a compra de produtos madeireiros provenientes da Amazônia.
Dentre esses critérios a associação sugere como prioridade para as prefeituras:
• Proibição do consumo de mogno;
• Exigência, como parte dos processos de licitação, das provas da cadeia de
custódia que identifiquem a origem da madeira;
• Preferência à madeira proveniente de planos de manejo sustentável, inclusive
madeira certificada pelo Conselho de Manejo Florestal (FSC) ;
• Orientação a construtores e empreiteiros para que substituam madeiras
descartáveis utilizadas em tapumes, fôrmas de concreto e andaimes por alternativas
reutilizáveis como ferro ou chapas de madeira resinada.
Como consumidores de madeira proveniente da Amazônia, os municípios
contribuem, ainda que de maneira indireta, para a exploração descontrolada e
predatória de madeira e alguns produtos florestais que acontece hoje na região
amazônica. A compra de madeira ilegal por municípios fere as leis ambientais,
trabalhistas e fiscais e deve ser proibida a fim de garantir a legalidade das aquisições
públicas, transformando as atividades de compras em política ambiental municipal.
O Governo Federal pode dar importante exemplo para os consumidores do país,
se passar a promover suas aquisições de mobiliário e madeira de forma a respeitar a
legislação ambiental, e também, em observação a práticas sustentáveis defendidas por
organizações de fomento ao consumo e à produção sustentável de madeira. Este
exemplo estabelecerá importante precedente no combate à exploração ilegal e
predatória de madeira amazônica, que hoje é a regra do mercado, e não a exceção,
deixando-se um recado claro aos madeireiros de que existe mercado consumidor para a
madeira produzida de forma sustentável.
Sendo assim, conclamamos o apoio dos nobres parlamentares dessa Casa
Legislativa para a acolhida da presente proposição.
Sala das Sessões, em
Deputado AUGUSTO CARVALHO
PPS
PROJETO DE LEI Nº DE 2007
Autoria: Deputado AUGUSTO CARVALHO
Institui o Programa Nacional de Qualidade
Ambiental e dá outras providências.
A CÂMARA DOS DEPUTADOS Decreta:
Art. 1º Fica instituído o Programa Nacional de Qualidade Ambiental – PNQA.
Parágrafo único. São diretrizes do PNQA:
I - incentivar a constante melhoria da qualidade do serviço prestado pelos
diversos órgãos e entidades do Poder Executivo Federal;
II - promover mudanças nos padrões de consumo e estimular a inovação
tecnológica e ecologicamente eficiente, usando o poder de compra da administração
pública Federal para fins da política ambiental;
III - adotar critérios ambientais nas especificações de produtos e serviços a
serem adquiridos pelo Poder Executivo Federal, respeitada, no que couber, a legislação
de licitações e contratos;
IV - estimular a adoção de medidas de prevenção e redução do impacto
ambiental causado por produtos e serviços potencialmente danosos ao meio ambiente;
V - fomentar o reconhecimento e a promoção de práticas sócio-ambientalmente
adequadas pelo poder público e pela iniciativa privada;
VI - difundir na sociedade a cultura do consumo sustentável.
Art. 2º Para desenvolver o PNQA, caberá ao Poder Executivo Federal as
seguintes ações:
I - dar publicidade à importância do consumo de produtos ou do uso de serviços
de estabelecimentos que obtenham selos ambientais, divulgando o conceito de
certificação ambiental;
II - valorizar e prestigiar o uso de sistemas de gestão, de produtos e de serviços
adequados sob o ponto de vista social e ambiental pela administração pública;
III - definir os procedimentos e critérios para o reconhecimento da qualidade
ambiental de produtos, serviços ou sistemas de gestão a serem observados na
contratação pelo poder público, aceitando processos de certificação realizados por
entidades privadas devidamente creditadas, nacional ou internacionalmente, respeitada
a legislação de licitações e contratos;
IV - adequar a execução direta ou indireta das obras públicas para que o
consumo de bens ambientais seja o estritamente necessário;
V - desenvolver, progressivamente, instrumentos para dar suporte técnico à
especificação de bens e serviços a serem adquiridos ou contratados pela administração
pública, observada a legislação de licitações e contratos;
VI - estabelecer as parcerias necessárias à efetivação do PNQA.
§ 1º Para a aquisição, descrição, padronização e recebimento dos bens e serviços
com características técnicas complexas, conteúdos subjetivos ou em situações
especiais, poderão ser solicitados serviços de peritos como suporte para a tomada de
decisões.
§ 2º Em casos onde a contratação tenha aspectos ambientais relevantes, o
Ministério do Meio Ambiente e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, deverão participar da elaboração do processo
de contratação.
§ 3º As Comissões de Licitação poderão, em face da complexidade ou das
especificidades do objeto da licitação, solicitar a constituição de Comissão Especial ou
a inclusão de membros com conhecimentos apropriados para proceder ao exame e ao
julgamento das propostas.
§ 4º A quantidade de bens a serem adquiridos ou utilizados em obras e serviços
contratados pelo Poder Público deve ser estimada em conformidade com a demanda, de
modo a evitar o desperdício.
§ 5º O Poder Executivo exigirá, na fase de habilitação licitatória ou em qualquer
contratação direta, a documentação que comprove a legalidade do funcionamento da
contratada para fins ambientais, conforme a legislação aplicável sobre a atividade.
Art. 3° As licitações visando compras de madeira, seus subprodutos, ou
imobiliário, ou ainda a execução de obras ou serviços, direta ou indiretamente
contratados, que de alguma forma utilizem madeira ou seus sub-produtos, observarão
os preceitos desta Lei, da Lei de Licitações, e da legislação ambiental em vigor, em
particular os instrumentos legais relacionados ao manejo, licenciamento, transporte e
comercialização de produtos florestais.
Art. 4° Fica proibida a compra de mogno (Swietenia macrophylla king) pela
administração pública, em função das restrições legais impostas para sua proteção por
configurar espécie ameaçada de extinção, exceção feita aos produtos de mogno
certificados pelo Conselho de Manejo Florestal (FSC).
Art. 5° O Poder Executivo deverá exigir que as empresas que participarem de
processos de licitação apresentem provas da legalidade da cadeia de custódia dos
produtos madeireiros, informando a origem dos mesmos e garantindo que seus
fornecedores estão de acordo com as legislações ambiental e trabalhista vigentes no
Brasil.
Art. 6° As empreiteiras encarregadas de obras públicas deverão substituir o uso
de fôrmas e andaimes e outros utensílio descartáveis feitos de madeira proveniente da
Amazônia, salvo quando forem certificadas pelo FSC, por alternativas reutilizáveis e
ambientalmente sustentáveis disponíveis no mercado.
Art. 7° Em igualdade de condições, como critério de desempate, será assegurada
preferência aos bens proveniente de manejo florestal sustentável, através de mecanismo
de pontuação, privilegiando-se o fornecedor que já esteja certificado pelo FSC.
Art. 8° O Poder Público adquirirá, direta ou indiretamente, apenas madeira
proveniente de Plano de Manejo Florestal autorizado pelo Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA.
§ 1° Será exigida a apresentação de documentação que comprove a legalidade
dos produtos florestais, incluindo a Autorização de Transporte de Produtos Florestais
(ATPF) do IBAMA com a informação da origem e numero do Plano de Manejo, e uma
cópia da Declaração de Acompanhamento e Avaliação de Plano de Manejo Florestal –
DAAPMF, protocolada pelo IBAMA.
§ 2° Os números da Autorização de Transporte de Produtos Florestais (ATPF)
deverão ser publicados no Diário Oficial da União toda vez que o poder público
divulgar o resultado da licitação da compra dos produtos florestais.
§ 3° Visando a redução do desperdício de madeira, as licitações devem
especificar produtos de madeira com as menores dimensões possíveis, compatíveis com
os requisitos determinados pelo projeto onde o material será empregado.
Art. 9° Para fins de verificação do cumprimento da lei, os documentos que
comprovem a legalidade e sustentabilidade das compras públicas de madeira e outros
produtos florestais não madeireiros devem ser tornados públicos e de fácil acesso e
entendimento para a população.
Art. 10. Esta Lei será regulamentada no prazo de 180 (cento e oitenta) dias
contados da sua publicação.
Art. 11. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 12. Revogam-se as disposições em contrário.
JUSTIFICAÇÃO
A justificativa a seguir faz parte do Programa Cidade Amiga da Amazônia,
patrocinada pela organização ambientalista Greenpeace.
A proposta de uma lei para regulamentar a licitação para aquisição de madeira,
seus subprodutos, ou mobiliário proveniente de produção sustentável, entendida como
aquela gerada com base em manejo florestal sustentável, na qual se verifica adequação
legal de toda a cadeia de custódia do produto final, baseia-se nos seguintes preceitos e
princípios legais:
- A "Agenda 21", advinda da Resolução nº 44/228, de 22.12.89, da Assembléia
Geral da Organização das Nações Unidas, cujos princípios foram abraçados pelos
países membros por ocasião do "Encontro da Terra - Rio 92", propugna em seu
capítulo 4 que os países devem estabelecer programas voltados ao exame dos padrões
insustentáveis de produção e consumo e o desenvolvimento de políticas e estratégias
nacionais de estímulo a mudanças nos padrões insustentáveis de consumo;
- A “Declaração do Rio”, adotada no “Encontro da Terra”, ou “Rio 92”, prevê
em seu PRINCÍPIO 8 que "para atingir o desenvolvimento sustentável e a mais alta
qualidade de vida para todos, os Estados devem reduzir e eliminar padrões
insustentáveis de produção e consumo e promover políticas demográficas adequadas";
- A adoção de normas, em diversos países, como Japão, Canadá , Países Baixos,
Noruega, África do Sul, e em particular nos Estados Unidos, citando-se como exemplo
o regulamento baixado durante o governo Clinton (Executive Order Number 12.873),
que estabeleceu sistema de compras pelo Estado por meio de licitações baseadas em
regras de respeito ao meio ambiente e à cidadania, prevendo, dentre outras, a
obrigatoriedade da aquisição de materiais reciclados, como o papel, óleos lubrificantes
re-refinados, pneus reaproveitados, etc.;
- O direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, e a obrigação
do Poder Público em defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações em
explicitado no artigo 225, caput, da Constituição Brasileira;
- A previsão de que o Poder Executivo deve incentivar as atividades voltadas ao
meio ambiente, visando ao desenvolvimento, no País, de pesquisas e processos
tecnológicos destinados a reduzir a degradação da qualidade ambiental; à fabricação de
equipamentos antipoluidores; e outras iniciativas que propiciem a racionalização do
uso de recursos ambientais, segundo consta do artigo 13, da Lei de Política Nacional do
Meio Ambiente (Lei No. 6.938/81);
- A previsão de crimes contra a flora, previstos na Lei de Crimes Ambientais
(Lei 9.605/98), destacados nos artigos 38 a 53, e , em particular, aqueles descritos nos
artigo 45 e 46, que proíbem o corte ou transformação em carvão madeira de lei, assim
classificada por ato do Poder Público, para fins industriais, energéticos ou para
qualquer outra exploração, econômica ou não, em desacordo com as determinações
legais e o recebimento e aquisição para fins comerciais ou industriais, de madeira,
lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal, sem exigir a exibição de licença do
vendedor, outorgada pela autoridade competente, e sem munir-se da via que deverá
acompanhar o produto até final beneficiamento;
- A previsão na Lei de Crimes Ambientais dentre as sanções restritivas de
direitos para participação em processos licitatórios dos infratores da norma (art. 72 Par.
8º. - proibição de contratar com a Administração Pública, pelo período de até 3 (três)
anos);
- A obrigatoriedade de elaboração de Estudo de Impacto Ambiental no caso de
Projetos Agropecuários que contemplem áreas acima de 1.000 ha. ou menores, neste
caso, quando se tratar de áreas significativas em termos percentuais ou de importância
do ponto de vista ambiental, inclusive nas áreas de proteção ambiental, segundo
estabelecem as Resoluções CONAMA Nº. 01/86 e Nº. 11/86;
- As limitações impostas pela legislação à exploração da espécie Swietenia
macrophylla King (mogno) em florestas nativas, primitivas ou regeneradas, permitida
somente sob a forma de manejo florestal sustentável, nos prazos e condições definidos
nas normas pertinentes;
- A previsão em Portaria do IBAMA, de 2002, da obrigatoriedade de
procedimentos relativos às atividades de Manejo Florestal Sustentável de Uso Múltiplo
na Amazônia Legal;
- A definição em Instrução Normativa do Ministério do Meio Ambiente (IN Nº.
3 / 2002) dos procedimentos de conversão de uso do solo através de autorização de
desmatamento nos imóveis e propriedades rurais na Amazônia Legal.
Segundo especialistas reunidos sob os auspícios da ONU para estudar a
problemática em questão, o "consumo sustentável" significa o atendimento das
necessidades das gerações presentes e futuras por bens e serviços de uma forma
sustentável econômica, social e ambientalmente. Visto que o consumo sustentável
depende da disponibilidade de bens e serviços ambientalmente sustentáveis, esse
consumo está integralmente associado à produção sustentável.
A promoção do consumo sustentável implica necessariamente a redução do
volume de bens consumidos e a alteração dos hábitos de consumo de forma a promover
a melhoria da qualidade de vida e a proteção do meio ambiente. Para se alcançar essa
finalidade, é preciso que se procure adquirir apenas o necessário para uma vida digna,
minimizar o desperdício e a geração de rejeitos (resíduos), bem como promover o
consumo de bens e serviços gerados e produzidos de forma a respeitar o meio
ambiente.
O governo federal estima que 80% da atividade madeireira na Amazônia ocorra
de forma ilegal, ou seja, a madeira é extraída de áreas não autorizadas, como terras
públicas, reservas nacionais ou territórios indígenas e o desmatamento irregular avança
sobre áreas intactas de floresta. No aspecto social, explorar madeira de origem ilegal
significa promover a evasão fiscal, o uso de tecnologias obsoletas e a geração de
empregos irregulares de baixa qualidade, além de envolver casos de trabalho escravo e
de violência contra trabalhadores rurais.
Existem duas formas de se extrair madeira na Amazônia de forma legalizada:
através de autorizações de desmatamento e através de Planos de Manejo Florestal
(PMFs). Apesar de descritas no Código Florestal, ambas têm sido utilizadas de maneira
irregular acarretando elevados índices de destruição florestal.
As autorizações de desmatamento são concedidas a proprietários privados que
têm o direito de desmatar até 20% de suas terras. Geralmente, antes de fazer o corte
raso para fins agrícolas ou de criação de gado, os fazendeiros vendem as espécies de
valor comercial aos madeireiros e utilizam o capital desta venda para preparar o solo.
Cumpre salientar que esse mecanismo é bastante predatório, e que poucas são as
práticas legais de exploração de madeira.
O estado do Pará é um bom exemplo de como esse mecanismo tem sido
perverso para o bioma da Amazônia. O Pará responde por 40% da atividade madeireira
da Amazônia Legal, e representa 1/3 do total desmatado na região. Ao se avaliar
conjuntamente os dados das autorizações de desmate concedidas pelas autoridades no
estado com as imagens de satélite ilustrando o real desmatamento, pode-se concluir que
apenas 1% do desmatamento tinha amparo legal. Em 2001, por exemplo, o IBAMA
concedeu autorizações de desmate para 5.342 hectares, mas o total desmatado possível
de ser identificado a partir de imagens as dos satélites disponibilizadas pelo INPE –
Instituto Nacional de Pesquisa Espacial – é de 523.700 hectares. Os números dos anos
anteriores são similares.
A outra forma de extrair madeira da Amazônia de forma legal é através do
manejo florestal. Os Planos de Manejo Florestal (PMFs) foram criados para permitir a
exploração da madeira sem destruição dos ecossistemas. Infelizmente, na prática, não é
o que acontece. Hoje vivemos uma grande farsa na implementação do instrumento
"manejo florestal" na Amazônia. Desde 1995, milhares de planos foram aprovados
pelo IBAMA , mas as madeireiras usando os planos de manejo florestal para legalizar
a extração ilegal de madeira.
Um relatório do IBAMA, de 1998, mostra que apenas 31% (866) de um total de
2806 planos aprovados foram considerados regulares pelo próprio IBAMA. Um novo
relatório do IBAMA, de 2000, mostra que a irregularidade continuou. Somente 405 ou
49% dos 822 planos restantes foram considerados regulares ou em manutenção. Em
suma, somente 14% dos planos existentes em 1998 foram aprovados em avaliação do
próprio IBAMA. O cancelamento e suspensão dos planos tiveram causas diversas.
Muitos madeireiros contratavam engenheiros florestais apenas para conseguir a
aprovação dos planos no IBAMA e depois os dispensavam. Outros deixavam de
executar o plano sem avisar o IBAMA. Por outro lado, engenheiros florestais
produziam “planos de manejo em série" que não eram cumpridos na prática.
Para cada PMF aprovado são concedidos anualmente documentos de transporte
de madeira correspondentes, referentes ao volume previsto no plano. Outro problema
freqüente de irregularidade é o uso desses documentos de transporte para legalizar
madeira extraída de forma ilegal em áreas públicas ou griladas, parques nacionais,
reservas biológicas e áreas indígenas. Assim, hoje em dia, é difícil garantir a origem
legal do produto madeireiro.
Um bom exemplo é o mercado de mogno - a mais valiosa madeira da Floresta
Amazônica - que foi paralisado em dezembro de 2001, quando o IBAMA proibiu a
exploração, transporte e comércio da espécie após comprovar as irregularidades
freqüentes características desse setor. Ações de fiscalização realizadas nas áreas de
extração e nas empresas exportadoras constataram a exploração ilegal em terras
indígenas e áreas públicas, fraude e desrespeito à legislação florestal. No dia 05 de
julho de 2003, foi aprovada nova legislação para a exploração mogno, estabelecendo
rígidas regras para garantir o manejo sustentável da espécie. O mogno, espécie
ameaçada de extinção, foi listado no Anexo II da CITES, uma convenção internacional,
aprovada sob os auspícios da ONU, que regulamenta o comércio de espécies de fauna e
flora ameaçadas de extinção. Reconhecendo a fragilidade dessa espécie de madeira,
urge reconhecer que o mogno deve receber tratamento especial e ser considerado em
seu status atual na paisagem, como espécie de baixa densidade, com altíssimo valor
econômico e correndo o risco de extinção comercial.
O manejo florestal sustentável deve ser praticado em áreas em que a situação
fundiária esteja regularizada e onde não haja disputas de terras. Nas áreas manejadas
não ocorre extração ilegal ou outras atividades não -autorizadas. Note-se que ao se
promover o manejo florestal, não se pode ameaçar ou diminuir os recursos , nem
prejudicar os direitos dos povos indígenas e tradicionais, devendo-se manter ou
ampliar, em longo prazo, o bem-estar econômico e social dos trabalhadores e das
comunidades locais. Para assegurar a viabilidade econômica e benefícios sociais e
ambientais, o manejo deve incentivar o uso eficiente dos múltiplos recursos florestais,
conservando a diversidade ecológica e mantendo a integridade da floresta.
A fim de se promover o consumo sustentável de madeira é recomendável a
aquisição de produção certificada pelo FSC (Forest Stewardship Council). Atualmente,
são reconhecidos como os melhores padrões e critérios de manejo florestal aqueles
estabelecidos pelo FSC (Forest Stewardship Council, ou Conselho de Manejo
Florestal). O FSC é o único sistema de certificação independente que adota padrões
ambientais internacionalmente aceitos, incorpora de maneira equilibrada os interesses
de grupos sociais, ambientais e econômicos e tem um selo reconhecido no mundo
todo. O sistema de controle do FSC assegura a integridade da cadeia de custódia da
madeira desde o corte da árvore até a destinação final dos produtos, ao serem
adquiridos pelos consumidores. O FSC oferece a melhor garantia disponível de que a
atividade madeireira ocorre de maneira legal e não acarreta a destruição das florestas
primárias como as da Amazônia. Neste anteprojeto de lei recomenda-se priorizar a
aquisição de madeira certificada pelo FSC, sempre que possível.
A questão da licitação sustentável vem sendo discutida no âmbito das Nações
Unidas, através de seu Programa para o Meio Ambiente (PNUMA), que promove uma
série de eventos e tem gerado literatura a respeito. O PNUMA definiu como licitação
sustentável o processo pelo qual as organizações adquirem suprimentos ou contratam
serviços levando em consideração os seguintes aspectos:
• O melhor valor para considerações monetárias que incluam a análise de preço,
qualidade, disponibilidade, funcionalidade, dentre outras;
• Aspectos ambientais ("licitação verde"), que constituem os efeitos sobre o meio
ambiente que o produto e/ou serviço tem em todo o seu ciclo de vida, ou seja, do berço
ao túmulo;
• O ciclo de vida integral dos produtos;
• Aspectos sociais: efeitos sobre questões sociais tais como a erradicação da
pobreza, equidade internacional na distribuição de recursos, direitos trabalhistas,
direitos humanos.
A inclusão de princípios de desenvolvimento sustentável nas práticas licitatórias
já é uma realidade em vários países como o Canadá, Japão, Áustria, Itália, Países
Baixos, Noruega, Estados Unidos e África do Sul. As experiências nesses países
indicam que a inclusão de considerações sobre consumo e produção sustentável nas
opções de compra pelo poder público não só é viável, mas tem o importante papel de
incentivar um mercado sustentável.
No Brasil essa questão começa a ser discutida e implementada na prática. No
ano 2000, o Ministério do Meio Ambiente, através de uma iniciativa do Consórcio
Parceria 21, apresentou um documento de subsídios à Elaboração da Agenda 21
Brasileira, que abordou o tema do consumo e produção sustentáveis, no qual se
formulou como premissa para a implementação de políticas públicas na área, o preceito
de que o setor público deve usar o poder de compra do Estado para induzir o mercado
de bens e serviços a adotar padrões de qualidade ambiental.
A Associação Greenpeace identificou a "licitação sustentável" como uma das
formas de se promover a produção e o consumo sustentáveis, e vem desenvolvendo
campanha no Brasil em parceria com prefeituras visando a adoção de políticas de
consumo sustentável, o que inclui o incentivo à aquisição de madeira proveniente de
manejo sustentável. Nessa campanha o Greenpeace tem estimulado prefeituras a
adotarem critérios para a compra de produtos madeireiros provenientes da Amazônia.
Dentre esses critérios a associação sugere como prioridade para as prefeituras:
• Proibição do consumo de mogno;
• Exigência, como parte dos processos de licitação, das provas da cadeia de
custódia que identifiquem a origem da madeira;
• Preferência à madeira proveniente de planos de manejo sustentável, inclusive
madeira certificada pelo Conselho de Manejo Florestal (FSC) ;
• Orientação a construtores e empreiteiros para que substituam madeiras
descartáveis utilizadas em tapumes, fôrmas de concreto e andaimes por alternativas
reutilizáveis como ferro ou chapas de madeira resinada.
Como consumidores de madeira proveniente da Amazônia, os municípios
contribuem, ainda que de maneira indireta, para a exploração descontrolada e
predatória de madeira e alguns produtos florestais que acontece hoje na região
amazônica. A compra de madeira ilegal por municípios fere as leis ambientais,
trabalhistas e fiscais e deve ser proibida a fim de garantir a legalidade das aquisições
públicas, transformando as atividades de compras em política ambiental municipal.
O Governo Federal pode dar importante exemplo para os consumidores do país,
se passar a promover suas aquisições de mobiliário e madeira de forma a respeitar a
legislação ambiental, e também, em observação a práticas sustentáveis defendidas por
organizações de fomento ao consumo e à produção sustentável de madeira. Este
exemplo estabelecerá importante precedente no combate à exploração ilegal e
predatória de madeira amazônica, que hoje é a regra do mercado, e não a exceção,
deixando-se um recado claro aos madeireiros de que existe mercado consumidor para a
madeira produzida de forma sustentável.
Sendo assim, conclamamos o apoio dos nobres parlamentares dessa Casa
Legislativa para a acolhida da presente proposição.